sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Absurdos - II

Ela olhou-se no espelho. Definitivamente aquele reflexo estava completamente desfigurado. Viu-se mas não se reconheceu. Ao ver fotografias antigas percebeu o porquê. Estava a envelhecer a passos largos. Aqueles olhos estavam agora envoltos em rugas. O rosto estava a ganhar contornos diferentes. O pior de tudo é que não se apercebera. Vê-se todos os dias e nunca tomou essa consciência. Estava incrédula. Nunca pensou que os anos se passassem assim tão depressa. Os objectivos a que se tinha proposto não os cumprira. Estava exactamente onde estava quando tinha 20 anos. E o seu espírito permanecia da mesma forma. Talvez por isso se tenha chocado.
Tem consciência de que fracassou. Transformou-se numa pessoa que sempre criticou. Percebe que tem o poder de reverter a situação, mas sabe que se acomodou demasiado a esta realidade que parece ser superior às suas forças. É tão pequenina. É demasiado pequenina e desprotegida. Ou isso ou então tenta justificar-se. Fá-lo a si própria. Que ser humano é este que até a si mesmo se engana? Resta-lhe pouco. Ou melhor não lhe resta nada. O que fazer quando já se perdeu tudo? Apesar de tudo parece-lhe que ainda há mais a perder. Há sempre mais alguma coisa que se pode perder, algo que ainda não percebeu bem o quê e que só se dará conta no dia que essa derrota vier ao seu encontro. Mais uma…
Estava cansada. Cansada e ofendida com um tempo que havia sido impiedoso para com ela. Deitou uma bebida qualquer num copo, sentou-se no cadeirão verde já coçado pelo uso, acendeu um cigarro e deixou-se ficar ali inerte à espera que algo de bom acontecesse.

1 comentário:

Bruno Fehr disse...

Há dias constatei o mesmo. As pessoas dizem-me que a minha cara não mudou e comparando com as minhas fotos de há 10 anos, não mudou mesmo. Mas, olhei para o espelho enquanto ria e aí vi aquelas rugas em volta dos olhos.

O facto de ver umas rugas, faz-nos analisar todo o nosso percurso até ali...

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